8.7.09

A POSSIBILIDADE DA “REFORMATIO IN PEJUS” NO DIREITO ADMINISTRATIVO.

A POSSIBILIDADE DA “REFORMATIO IN PEJUS” NO DIREITO ADMINISTRATIVO.

André Souza da Silveira

“Reformatio in pejus”, do latim, significa “reformar a sentença para pior”, ou seja, A Reformatio in pejus ocorre quando um cidadão postula perante a Administração Pública, por intermédio de um recurso administrativo, uma melhora em sua situação jurídica e tem sua situação piorada por ocasião da apreciação de suas razões pelo órgão julgador, onde, esta problemática decorre de um conflito entre o dever da Administração Pública de zelar pela legalidade de seus atos e o direito dos cidadãos ao devido processo legal, à ampla defesa, ao contraditório e à segurança jurídica, não sendo pacífica a solução para esse conflito, que ocorre entre a autoridade e a liberdade.

Princípios que reforçam seu uso

O principio da legalidade é utilizado como fundamento para possibilitar a reformatio in pejus, pois a proibição da reforma em prejuízo implicaria a manutenção do ato, ainda que sua ilegalidade viesse a ser constatada pela segunda instância administrativa.
A nossa Constituição mostra no caput do art. 37, o princípio da legalidade como norteador da Administração Pública. Isso não significa, portanto, que os órgãos públicos possam fazer tudo o que a lei não proíba. Tendo que a Administração Pública tem uma relação peculiar com a legalidade, aplica-se a ela o princípio da legalidade estrita, segundo o qual os agentes estatais somente podem fazer aquilo que a lei expressamente determina e permite
No que tange o principio da indisponibilidade do interesse público, Bandeira de Mello nos trás que:
“A indisponibilidade dos interesses públicos significa que sendo interesses qualificados como próprios da coletividade - internos ao setor público - não se encontram à livre disposição de quem quer que seja, por inapropriáveis. O próprio órgão administrativo que os representa não tem disponibilidade sobre eles, no sentido de que lhe incumbe apenas curá-los - o que é também um dever - na estrita conformidade do que predispuser a intentio legis.”

Vê-se então que a indisponibilidade do interesse público vai além do princípio da legalidade trazendo consigo a noção de que o agente público tem o dever de atuar de acordo com a finalidade prevista na lei, dela não podendo renunciar ou mesmo afastar-se. Isso implica dizer que, verificada a existência de um ilícito, o agente público tem a obrigação de combatê-lo, ou seja, não pode escolher entre atuar ou ficar em silêncio. Essa é a razão pela qual se afirma que esse princípio daria margem à reformatio in pejus no processo administrativo.

O princípio inquisitivo caracteriza-se pelo reconhecimento da liberdade de iniciativa do juiz, tanto para instaurar a relação processual, como para promover o seu desenvolvimento. Por todos os meios a seu alcance, o julgador procura descobrir a verdade real, independentemente da iniciativa e da colaboração das partes. Já o princípio dispositivo deixa a sorte do processo à livre disponibilidade das partes, sendo que a elas, com exclusividade, incumbe toda iniciativa, seja na instauração do processo, seja no seu impulso, seja na sua instrução. As provas portanto, só podem ser produzidas pelas partes e a própria marcha processual depende da manifestação propulsiva dos litigantes.

De acordo com o princípio dispositivo, incumbe às partes dar andamento ao processo e produzir as provas necessárias. O princípio inquisitivo, por sua vez, confere poderes ao juiz para instaurar, promover a relação processual e anexar aos autos as provas necessárias à elaboração da decisão.
O processo administrativo é norteado predominantemente pelo princípio inquisitivo, ou seja, significa que a Administração Pública tem o dever de instaurar processos administrativos e zelar pelo seu bom andamento. Significa também que a Administração Pública pode carrear aos autos as provas que julgar necessárias à elaboração da decisão.
A primeira prerrogativa é denominada princípio da oficialidade enquanto a segunda é denominada princípio da verdade material.
O princípio da oficialidade, de acordo com o qual a mobilização do procedimento administrativo, uma vez desencadeado pela Administração ou por instigação da parte, é encargo da própria Administração; vale dizer, cabe a ela, e não a um terceiro, a impulsão de ofício, ou seja, o empenho na condução e desdobramento da seqüência de atos que o compõem até a produção do ato final, conclusivo.

Sendo que esse dever também engloba a produção de provas, chamado de principio da verdade material, onde exprime que a Administração deve tomar decisões com base nos fatos tais como se apresentam na realidade, não se satisfazendo com a versão oferecida pelos sujeitos. Para tanto, tem o direito e o dever de trazer para o expediente todos os dados, informações, documentos a respeito da matéria tratada, sem estar jungida aos aspectos suscitados pelos sujeitos, ou seja, é necessário que a administração traga os elementos necessários para a prolação de uma decisão administrativa adequada.

Tendo sido verificado o conteúdo dos princípios inquisitivo, da oficialidade e da verdade material fica mais fácil identificar as razões pelas quais têm servido de fundamento para justificar a reformatio in pejus. É que esses princípios conferem poderes para que a Administração Pública possa aplicar a lei de modo adequado atendendo, assim ao interesse público. Impossibilitar a reforma da decisão, após a constatação de uma ilegalidade, implicaria a negação desses princípios em face do caso concreto.

Sendo assim, é pacífico verificar que é possível a reformatio in pejus no Direito administrativo, porém é debatida a questão ainda, sendo defendida por uma parte da doutrina, mas contestada por outra, gerando um conflito de princípios. Tendo que a reformatio in pejus somente surge nos processos administrativos onde esteja presente alguma litigiosidade. A constatação de uma ilegalidade nos processos de outorga equivale a constatar que o interesse público que norteia a edição da regra foi desatendido e isso possibilita a reformatio in pejus como forma de evitar danos à coletividade.

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